Os seis pilares da alfabetização

Ensino Básico
Leitura em
5
min
Publicado em
17
/
07/2020
Autor
Fabrício Garcia
CEO na Plataforma Qstione
Fabrício Garcia é um professor da área de saúde apaixonado pelas novas tecnologias educacionais. Seu foco principal de trabalho está em ajudar instituições de ensino e professores a implementar novas tecnologias que aumentem a eficiência educacional, justamente por acreditar que a tecnologia é o caminho mais simples para democratizar a educação de qualidade no Brasil.
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Você trabalha no universo educacional? Então, neste artigo, iremos debater sobre os seis pilares da alfabetização. Mas, antes, precisamos entender sobre literacia.

As capacidades de leitura, escrita e interpretação de textos constituem o processo de alfabetização e exigem do estudante um conjunto de habilidades cognitivas e psicomotoras complexas. Estas são trabalhadas, em parte, nos anos anteriores ao período de alfabetização. Dessa forma, conceitualmente, o domínio de tais habilidades ou competências de leitura e escrita podem ser definidas como literacia.

A análise do nível de literacia dos estudantes é um ponto estratégico para educação de qualquer país. Isso acontece porque a base educacional de uma nação reside, majoritariamente, no domínio da linguagem. Por isso, a discussão sobre os métodos de alfabetização são tão importantes no universo educacional.

Como a anda a literacia dos estudantes brasileiros?

Nos últimos 25 a 30 anos, tivemos pouco espaço para discussão dos métodos de alfabetização no Brasil. O letramento baseado em métodos analíticos e associado a estratégias de ensino construtivistas dominaram o cenário educacional brasileiro (Leia: Instrução direta vs. construtivismo: Eis a questão). Contudo, pouco se discutiu sobre os resultados ou se analisou o impacto da utilização dessas metodologias na literacia dos nossos estudantes.

Nesse contexto, em 2019, foi instituída a Política Nacional de Alfabetização (PNA), por meio do Decreto nº 9.765, de 11 de abril de 2019. Considero que este documento foi um marco para educação brasileira, pois, o Ministério da Educação (MEC) o emitiu totalmente baseado em alicerces técnicos. Isto é, norteando e dando diretrizes fundamentais para adoção de boas práticas pedagógicas em alfabetização.

Dados relevantes do PNA

O PNA cita dados assustadores acerca dos resultados obtidos por nossos estudantes em diversas avaliações nacionais e internacionais. Dentre esses dados, destaco:

  1. segundo os resultados da Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA), de 2016, 54,73% dos mais de 2 milhões de estudantes que concluíram o terceiro ano do ensino fundamental apresentaram desempenho insuficiente em leitura. Desse total, cerca de 450 mil estudantes foram classificados no nível 1 de leitura. Isso significa que são incapazes de localizar informação explícita em textos simples (de até cinco linhas) e de identificar a finalidade de textos como convites, cartazes, receitas e bilhetes.
  2. segundo o Censo escolar de 2018, no 7º ano, mais de 810 mil alunos matriculados nas redes federal, estadual e municipal estavam com dois anos ou mais de atraso escolar.
  3. o Brasil ficou em 59º lugar em leitura na edição de 2015 da avaliação do PISA, num rol de 70 países.

Em suma, nossos resultados são bem desanimadores e, indiscutivelmente, podemos concluir que o nível de literacia dos nossos estudantes é muito baixo. Assim, temos um efeito cascata que determina o baixo aprendizado dos nossos estudantes durante toda a vida escolar.

Que caminho o Brasil deve seguir?

Este artigo não objetiva discutir tecnicamente os diversos métodos de alfabetização. Talvez, em outra oportunidade, podemos discutir tais métodos e técnicas pedagógicas. Contudo, considerando o que tenho lido sobre o tema, considero o método fônico o mais interessante e, provavelmente, na média, o mais eficaz. Todavia também acredito que outras estratégias podem e devem ser utilizadas para auxiliar o processo de alfabetização. Na educação, dificilmente encontramos fórmulas prontas que servem para todas as situações. Por isso, o professor precisa se adaptar e dominar diferentes técnicas para atingir o seu objetivo em sala de aula.

Diante do exposto, vamos focar nas principais diretrizes e recomendações para melhoria do processo de alfabetização e consequente aumento do nível da literacia dos nossos estudantes. Em seguida, falaremos sobre os seis pilares da alfabetização. Para isso, resolvi utilizar como base, o relatório do National Reading Panel (NRP) (2000).

Sobre o NRP

Trata-se de um estudo solicitado pelo congresso americano, em 1997. Seu intuito era avaliar a eficácia das diferentes abordagens do ensino de leitura nos Estados Unidos. O relatório foi publicado em 2000. Como parte do trabalho, foram realizadas audiências públicas, em diversos Estados americanos, a fim de ouvir os principais interessados no tema (professores, pais e estudantes). Essas audiências geraram alguns consensos que nortearam o início do trabalho, como vemos a seguir:

  • a importância dos pais, família e/ou responsáveis em proporcionar às crianças experiências literárias precoces, que envolvam a alfabetização e o incentivo a leitura;
  • intervenção precoce no caso de crianças com dificuldade de aprendizado e leitura;
  • valorização da consciência fonética e da boa literatura na instrução da leitura, e a necessidade de desenvolver a compreensão de como integrar diferentes abordagens de leitura para melhorar a eficácia de instrução para todos os estudantes;
  • necessidade de informações claras, objetivas e cientificamente fundamentadas sobre a eficácia dos diferentes métodos de alfabetização, com informações sobre as políticas e práticas utilizadas;
  • importância de aplicar altos padrões de evidência científica ao processo de revisão dos estudos relacionados aos métodos de alfabetização;
  • valorização do papel do professor, seu desenvolvimento profissional, suas interações e colaborações com pesquisadores da área.

E no Brasil?

Atualmente, no Brasil, desconheço qualquer trabalho sobre a alfabetização, que tenha seguido tais diretrizes. O National Reading Panel é um daqueles trabalhos que precisam ser copiados e deve servir como base para futuras pesquisas sobre o tema no Brasil. Contudo, enquanto não temos pesquisas locais com esse nível de maturidade científica, podemos utilizar o estudo americano para nortear nossos direcionamentos e políticas públicas educacionais. Especialmente porque o referido estudo trata especificamente de métodos de ensino de leitura.

Dito isto, o PNA utiliza, acertadamente, o National Reading Panel como uma de suas principais fontes científicas para preconizar as políticas públicas educacionais que tangem a alfabetização no Brasil. Dessa forma, acredito que o país deu um passo na direção certa. A melhoria da educação e, especificamente, da literacia dos estudantes brasileiros, depende da aplicação de métodos com eficácia cientificamente comprovadas. Além de um processo constante de avaliação.

Como melhorar o nível de literacia dos estudantes brasileiros?

Agora sim, podemos debater sobre os 6 pilares da alfabetização com base no NRP e no PNA:

Instrução da consciência fonêmica (Consciência fonológica)

A medida que a criança adquire o conhecimento alfabético, isto é, identifica o nome das letras, seus valores fonológicos e suas formas, emerge a consciência fonêmica. Esta se trata da habilidade metalinguística de conhecer e manipular intencionalmente a menor unidade fonológica da fala, o fonema (Fonte: PNA) (ADAMS et al., 2005; CAPOVILLA, A.; CAPOVILLA, F., 2000; CARDOSO-MARTINS, 2006).

O estudo realizado no NRP comprovou que a consciência fonêmica é uma habilidade que pode ser ensinada, sendo fundamental para o desenvolvimento da leitura pelos estudantes. A instrução da consciência fonêmica é mais eficaz quando o professor relaciona os fonemas às letras. Nesse sentido, o estudante passa a entender a relação fonema-grafema (Instrução fonética).

Instrução fonética (Conhecimento alfabético)

Aprender a ler é uma habilidade extremamente complexa para iniciantes, pois, entre outras coisas, o estudante precisa compreender os sistema alfabético. Inicialmente, o primeiro desafio deste aprendizado envolve o entendimento das correspondências entre letras e sons, padrões de ortografia e como aplicar esses conhecimentos no processo de leitura. Portanto a instrução fonética é uma estratégia de ensino que enfatiza tais correspondências (letras e sons) e suas aplicações na leitura e para soletrar palavras.

Fluência

Leitores fluentes são capazes de ler textos com velocidade, expressão e precisão adequadas. Arrisco dizer, que, possivelmente, a falta de fluência, talvez seja a habilidade mais visível em adultos com deficiência de leitura. Por exemplo, no Brasil, quem não conhece alguém que tem dificuldade de acompanhar as legendas dos filmes legendados?

No caso das crianças, a falta de fluência pode gerar impactos negativos ao aprendizado. Em alguns casos, a falta de compreensão de textos pode estar relacionada à baixa fluência de leitura. Por isso, é preciso inserir estratégias de ensino que promovam a aquisição da fluência em leitura, pelos estudantes.

Compreensão

A compreensão é a essência da leitura. É uma habilidade cognitiva complexa, que envolve a capacidade do estudante de interpretar e entender o que está escrito. O NRP destaca 3 áreas fundamentais que influenciam a compreensão dentro da alfabetização: a instrução de vocabulário, instrução de compreensão de texto e as estratégias instrução de preparação do professor. Entre elas, eu destaco a instrução do vocabulário como a área basilar para o processo de aprendizado do estudante.

Evidentemente, existem níveis de compreensão. Contudo, a compreensão é uma habilidade que, em muitos casos, apresenta-se deficiente em adultos e, até mesmo, em alguns professores. Isso retrata, em parte, a gravidade do problema educacional brasileiro.

Vocabulário

As crianças devem ser expostas a um vocabulário mais amplo, antes mesmo de ingressar no ensino fundamental. Nesse sentido, na escola, é possível aplicar técnicas de leitura e dinâmicas que possibilitem o aumento do vocábulo das crianças, pois, quanto mais amplo é o vocabulário do indivíduo, mais fácil será o reconhecimento das palavras e consequente compreensão de texto.

Escrita

O exercício da escrita ajuda a reforçar a consciência fonêmica, a instrução fônica, o desenvolvimento da coordenação motora fina, a entender as tipologias e gêneros textuais. Por isso, a escrita deve ser estimulada e constantemente avaliada.

A sua instituição de ensino ou a escola do seu filho se baseia nos 6 pilares da alfabetização citados neste artigo? Aprofunde seu conhecimento sobre o tema lendo documentos citados neste artigo ou entre em contato com a equipe Qstione para conhecer o nosso trabalho na área educacional.

Até o próximo artigo!

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